7 de fevereiro de 2010

Dos Anjos

O Grito - Obra do artista expressionista Edvard Munch (1893)

Uma mulher desesperada
Busca resgatar seu maior tesouro
Sem voz, sem luz, sem som, sem palavras
Perambula às escuras pelas ruas ensolaradas
Em busca de ajuda, acolhida.

Bate em diversas portas
Inclusive a da justiça, da lei, da segurança
E não obtém resposta.

Que ironia! A vítima escondida,
E o bandido sorri e desfila!
Uma porta se abre, mas dez à sua frente, estão cerradas
Pelo concreto da indiferença
Que nos faz dizer não sem sentir mágoas.

E dizemos a todo o momento:
É seu direito! Mas...
Não há vagas, não podemos, não temos, e algumas vezes, não queremos.

Ter direito não serve de alento a essa mulher desesperada
Que sem compreender o seu momento
Sentada, prostrada, na bancada
Sorri em agradecimento
Pela atenção que lhe foi dada.

Eu, em seu lugar, não sorriria
Gritaria, espernearia, choraria
Mas... quando não se pode
Gritar, ouvir, escrever ou se expressar

Quando se vive em mundo
No qual os símbolos não se refletem
Resta somente o choro e a resignação.
Por que, por aqui, o direito se adquire através do berro.

5 comentários:

  1. O poema Dos Anjos, foi escrito como um desabafo após o atendimento a uma munícipe muda, com baixa audição, não alfabetizada e que não dominava a LIBRAS - Lingua Brasileira de Sinais.
    Foi deixada no Cras por policiais militares que claramente queriam livrar-se do problema.
    Desesperada, buscava por seu filho, que fora levado por seu companheiro que a agredia com frequencia.
    Diante dessa situação, a equipe técnica do Cras mobilizou-se a fim de tentar compreender o que se passava com aquela mulher e de alguma forma, assisti-la.
    Por fim, após horas de ariculação e ação conjunta com a rede socioassistencial, conseguimos dar um final "feliz à história".
    No entanto, durante dias fiquei incomodada com a situação com a qual me deparei.
    Uma pessoa que, no auje dos seus 30 anos estava totalmente excluída, sem possibilidade de comunicação formal, presa em seu mundo, com suas angustias, com seu sofriemento, tendo que contar somente com a boa vontade dos outros para acessar qualquer tipo de serviço.
    Expressão de como o Estado Brasileiro ainda desampara seus deficientes. Expressão de como o BPC, uma ação tão importante para esse segmento da população, acaba sendo ineficiente se a família não tiver acompanhamento às demais questões que estão presentes na tão complexa realidade da pessoa com deficiência.
    Uma outra questão que foi posta nesse atendimento,foi a necessidade de capacitação dos profissionais do SUAS. E se Maria dos Anjos dominasse a LIBRAS, resolveirai nosso problema de comunicação? Não! Nenhum dos técnicos do CRAS em questão passaram por capacitação para atender pessoas mudas. Então recorremos à recursos diversos (figuras, desenhos, mímicas)para buscar estabelecer um canal de comunicação. No entanto, ha que se ter disposição para tal, e quando um sistema tem que contar somente com a disposição das pessoas para garantir o princípio do acesso universal aos direitos, corre-se um sério risco de que o mesmo seja violado.

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  2. Puxa, poema e comentário bastante interessantes. Trabalhamos nas bordas dos limites, geralmente fora dele, né? Às vezes, pergunto-me se essa falta crônica, que geralmente é contornada improvisadamente de alguma forma com o que temos, deve-se à sociedade ter a assistência social que deseja ou à impossibilidade de darmos conta mesmo de toda a realidade que se impuser a nós com as suas inúmeras facetas. Não tenho resposta sobre isso, só uma dor-de-cabeça que não cessa.

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  3. Olá Jura.
    Uma análise de conjuntura sobre a realidade com a qual nos deparamos, me levou a crer que essa é a assistência social que nossos gestores e governantes desejam, e para mante-la é necessário não instrumentalizar os profissionais que estão na ponta, desmotiva-los e mante-los com uma sensação de despentencimento em relação à tudo o que leem, estudam e esperam da política pública de assistencia social.
    Sei que capacitação nenhuma nos daria bagagem suficiente para "darmos conta" das inúmeras facetas da questão social, seria muita pretenção de nossa parte achar que isso seria possível. No entanto, quando não se tem o mínimo, haja cabeça para tanta dor.

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  4. Este comentário foi removido pelo autor.

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  5. Que bacana Débora, gostei muito. Conheci você em um dos pavios da cultura, lá no Centro Cultural de Suzano. Quero lhe apresentar meu blog também: www.canela-s.blogspot.com

    Vamos trocando ideias ok? Bjs!

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